A imprensa esconde o número para se apegar a chamarizes de apelo meramente publicitário
O
jornalismo precisa parar de se comportar como manada, deixar de lado os
releases e enfiar a cara nos números. Ontem, começaram a vir a público
os dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2014, que traz o
balanço de 2013. Varreu a imprensa a informação de que a polícia
brasileira matou em cinco anos mais do que a americana em 30 anos. Há
seis ocorrências dessa natureza por dia. Decidiu-se ignorar o número de
policiais mortos nos dois países e, claro, de homicídios, que é, este
sim, um indicador relevante sobre a violência. Hoje, mais uma chamadinha
publicitária: no Brasil, uma pessoa morre assassinada a cada 10
minutos. No total, foram 53.646 pessoas. Sim, é muito grave. É bem
verdade que o anuário — íntegra aqui)
resolveu fazer uma introdução chamando atenção para esses números. É
mais fácil pegar o que já está mastigado. Sim, são informações
relevantes. Precisam ser divulgadas. Mas também é preciso avançar e ler o
material.
Por várias
razões — incluindo as conurbações e suas óbvias dificuldades de
infraestrutura —, o estado de São Paulo poderia estar entre aqueles em
que mais se mata no Brasil. E, ora vejam, é aquele que apresenta a menor
taxa de Crimes Violentos Letais Intencionais (CVLI), que inclui
latrocínio e mortes violentas. Sim, leitores: se eu disser que o Estado
de São Paulo é aquele em que um brasileiro tem menos chance de morrer
assassinado, sei que vai parecer chocante. Mas essa é a realidade. Os
números não foram inventados por tucanos. São do Ministério da Justiça.
A taxa de
Crimes Violentos Letais Intencionais em São Paulo em 2013 foi de 11,7
por 100 mil habitantes. A ONU considera que a violência deixa de ter um
caráter epidêmico quando a taxa chega a 10. É claro que ainda é muito
alto. Na Alemanha, por exemplo, é de apenas 0,8. É importante, no
entanto, destacar que, em São Paulo, a redução de 2012 para 2013 foi de
11,7%. Em 12 anos, os homicídios no Estado tiveram uma queda de 70%.
O Estado
mais próximo de São Paulo é Santa Catarina, com 12 crimes violentos
letais intencionais por 100 mil. Mas está inserido no grupo de unidades
da federação que apresentam dados de confiabilidade apenas média: os
outros são Amapá, Piauí, Rio Grande do Norte, Roraima, Sergipe e
Tocantins. Vale dizer: desconfia-se que, nesses estados, há mais mortes
do que o registrado.
Entre as
unidades com dados de alta confiabilidade, a que chega mais perto de São
Paulo é o Rio Grande do Sul, com 19,5 mortes por 100 mil — vale dizer: o
que está em segundo lugar apresenta taxa 66% maior. Na campanha
eleitoral, Dilma prometeu mundos e fundos na área de segurança. É mesmo?
Com que expertise? Vamos ver a realidade em estados governados por seu
partido: no pequeno Acre, os mortos são 27,1 por 100 mil, 137% a mais do
que em São Paulo; na Bahia, 37,9% — 224% a mais; em Sergipe, governado
pelo PT até outro dia, são 42,2 por 100 mil — 260% a mais; no rico
Distrito Federal, 26,8 — 129% a mais. Os petistas têm de aprender com
São Paulo. Em vez disso, como é sabido, a política de segurança do
Estado foi alvo das mais estúpidas vilanias do governo federal,
oriundas, muito especialmente, do ministro da Justiça, José Eduardo
Cardozo.
Mesmo a
tão cantada em prosa e verso política de segurança do Rio de Janeiro dá
sinais evidentes de fadiga. Algo precisa ser feito: foram 30 por 100 mil
os crimes violentos intencionais em 2013, 157% a mais do que São Paulo,
com crescimento de 15% em relação a 2012.
O anuário
tem dados aos montes, e ainda voltaremos a esses números muitas vezes.
Há outros cruzamentos e conclusões importantes. Por ora, que fique o
registro: se o governo federal quer uma política de segurança pública
mais eficiente, tem de começar a aprender com quem faz melhor.
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