por Marco Antonio Villa
Tudo tem um começo e um fim, como poderia dizer o Marquês de Maricá. E o fim está próximo
A cinco meses da eleição presidencial é evidente o sentimento de
enfado, cansaço, de esgotamento com a forma de governar do Partido dos
Trabalhadores. É como se um ciclo estivesse se completando. E terminando
melancolicamente.
A construção do amplo arco de alianças que
sustenta politicamente o governo Dilma foi, quase todo ele, organizado
por Lula no início de 2006, quando conseguiu sobreviver à crise do
mensalão e à CPMI dos Correios. Naquele momento buscou apoio do PMDB —
tendo em José Sarney o principal aliado — e de partidos mais à direita.
Estabeleceu um condomínio no poder tendo a chave do cofre. E foi pródigo
na distribuição de prebendas. Fez do Tesouro uma espécie de caixa 1 do
PT. Tudo foi feito — e tudo mesmo — para garantir a sua reeleição.
Parodiando um antigo ministro da ditadura, jogou às favas todo e
qualquer escrúpulo. No jogo do vale-tudo não teve nenhuma
condescendência com o interesse público.
A petização do Estado
teve início no primeiro mandato, mas foi a partir de 2007 que se
transformou no objetivo central do partido. Ter uma estrutura permanente
de milhares de funcionários petistas foi uma jogada de mestre. Para
isso foram necessários os concursos — que garantem a estabilidade no
emprego — e a ampliação do aparelho estatal. Em todos os ministérios,
sem exceção, aumentou o número de funcionários. E os admitidos — quase
todos eles — eram identificados com o petismo.
Desta forma — e é
uma originalidade do petismo —, a tomada do poder (o assalto ao céu,
como diria Karl Marx) prescindiu de um processo revolucionário, que
seria fadado ao fracasso, como aquele do final da década de 60, início
da década de 70 do século XX. E, mais importante, descolou do processo
eleitoral, da vontade popular. Ou seja, independentemente de quem vença a
eleição, são eles, os petistas, que moverão as engrenagens do governo. E
o farão, óbvio, de acordo com os interesses partidários.
Se no
interior do Estado está tudo dominado, a tarefa concomitante foi a de
estabelecer um amplo e fiel arco de dependência dos chamados movimentos
sociais, ONGs e sindicatos aos interesses petistas. Abrindo os cofres
públicos com generosidade — e que generosidade! — foi estabelecido um
segundo escudo, fora do Estado, mas dependente dele. E que, no limite,
não sobrevive, especialmente suas lideranças, longe dos recursos
transferidos do Erário, sem qualquer controle externo.
O terceiro
escudo foi formado na imprensa, na internet, entre artistas e vozes de
aluguel, sempre prontas a servir a quem paga mais. Fazem muito barulho,
mas não vivem sem as benesses estatais. Mas ao longo do consulado
petista ganharam muito dinheiro — e sem fazer esforço. Basta recordar os
generosos patrocínios dos bancos e empresas estatais ou até diretamente
dos ministérios. Nunca foi tão lucrativo apoiar um governo. Tem até
atriz mais conhecida como garota-propaganda de banco público do que pelo
seu trabalho artístico.
Mas tudo tem um começo e um fim, como
poderia dizer o Marquês de Maricá. E o fim está próximo. O cenário não
tem nenhum paralelo com 2006 ou 2010. O desenho da eleição tende à
polarização. E isto, infelizmente, poderá levar à ocorrência de choques e
até de atos de violência. O Tribunal Superior Eleitoral deverá ser
muito acionado pelos partidos. E aí mora mais um problema: quem vai
presidir as eleições é o ministro Dias Toffoli – como é sabido, de
origem petista, foi advogado do partido e assessor do sentenciado José
Dirceu.
Se a oposição conseguir enfrentar e vencer todas estas
barreiras, não vai ter tarefa fácil quando assumir o governo e encontrar
uma máquina estatal sob controle do partido derrotado nas urnas. As
dezenas de milhares de militantes vão — se necessário — criar todo tipo
de dificuldades para a implementação do programa escolhido por milhões
de brasileiros. Aí — e como o Brasil é um país dos paradoxos — será
indispensável ao novo governo a utilização dos DAS (cargos em comissão).
Sem eles, não conseguirá governar e frustrará os eleitores.
Teremos então uma transição diferente daquela que levou ao fim da
Primeira República, em 1930; à queda de Vargas, em 1945; ou, ainda, da
que conduziu ao regime militar, em 1964. Desta vez a mudança se dará
pelo voto, o que não é pouco em um país com tradição autoritária. O
passado petista — que imagina ser eterno presente — terá de ser
enfrentado democraticamente, mas com firmeza, para que seja respeitada a
vontade das urnas.
É bom não duvidar do centralismo democrático
petista. Não deve ser esquecido que o petismo é o leninismo tropical.
Pode aceitar sair do governo, mas dificilmente sairá do aparelho de
Estado. Se a ordem de sabotar o eleito em outubro for emitida, os
militantes-funcionários vão segui-la cegamente. Claro que devidamente
mascarados com slogans ao estilo de “nenhum passo atrás”, de “manter as
conquistas”, de impedir o “retorno ao neoliberalismo”. E com uma onda de
greves.
A derrota na eleição presidencial não só vai implodir o
bloco político criado no início de 2006, como poderá também levar a um
racha no PT. Afinal, o papel de Lula como guia genial sempre esteve
ligado às vitórias eleitorais e ao controle do aparelho de Estado. Não
tendo nem um, nem outro, sua liderança vai ser questionada. As
imposições de “postes”, sempre aceitas obedientemente, serão criticadas.
Muitos dos preteridos irão se manifestar, assim como serão recordadas
as desastrosas alianças regionais impostas contra a vontade das
lideranças locais. E o adeus ao PT também poderá ser o adeus a Lula.
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